Quando digo que trabalho com música, muitas pessoas me dizem que adoram música, mas que não tem habilidade musical nenhuma. Acho, porém, que estão sendo excessivamente autocríticas.
Vou explicar:
Recordemos que algumas gerações atrás, antes da televisão e do rádio, as famílias se reuniam para fazer música com diversos propósitos. Hoje, muitas vezes, é muito grande a ênfase na técnica e na capacitação, na preocupação de analisar ( ou se auto-analisar ) se o músico é “suficientemente bom” para tocar para outros.
De certa forma em nossa cultura, ficou impregnada a ideia enganosa de que fazer música se tornou uma atividade reservada aos especialistas, o resto de nós se limita a ouvir.
Esse pensamento, estabelecendo um imaginário abismo entre os especialistas em música e os músicos do dia a dia faz com que as pessoas muitas vezes se sintam desestimuladas em seguir praticando.
Mas pense bem, embora ninguém seja capaz de jogar tênis como um Roger Federer, futebol como um Messi ou cozinhar como um grande “Master Chef”, qualquer um pode curtir um "Futebolzinho" com os amigos ou preparar um jantar para a família.
Embora muitas pessoas digam que suas aulas de música "não foram adiante", a verdade é que o contato com a música, (comprovadamente constatado nos laboratórios pelos neurocientistas cognitivos ) estimula e desenvolve diversas áreas.
Até mesmo um breve período de aprendizagem musical gera circuitos neurais de processamento musical aprimorados e mais eficientes do que de pessoas sem qualquer contato com o estudo musical. O ato de ouvir, tocar e compor música mobiliza quase todas as áreas do cérebro até agora identificadas, envolvendo quase todos os subsistemas neurais.
Além disso, o que muitos não sabem ou esquecem, é que há muitas formas de ser um músico, e não é necessariamente preciso tocar um instrumento para isso. Há grandes compositores - como exemplo, Irving Berlin - que carecem de algo que a maioria de nos consideraria fundamental, tocar bem um instrumento.
Todos nós somos capazes de perceber, nos desenvolvermos na audição e no estudo musical, capazes de estabelecer diferenciações muito sutis entre os diversos elementos inseridos na música, ainda que não possamos articular os motivos técnicos.
As aulas de música ensinam não somente a tocar um instrumento, mas a ouvir melhor e acelerar a capacidade de discernir estrutura e forma na música, ajudando a descobrir um universo de possibilidades, como exemplo, porque gostamos de determinada música, o que ela gera que nos atrai ?
Assim sendo, siga em frente, não pense que você não está evoluindo, meramente por que algumas vezes não vê o resultado que gostaria. Os maiores efeitos não são de forma alguma os que fazem maior barulho ou são mais facilmente observados. Os maiores efeitos são geralmente silenciosos, quietos, e difíceis de detectar no momento em que estão sendo produzidos.
Pense na influência da lua na terra, e do ar nos pulmões humanos. Lembre como silenciosamente o orvalho cai, e como imperceptivelmente a grama cresce. Há muito mais coisas sendo produzidas em sua alma através do contato com a música do que podemos imaginar.
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